SEJAM BEM VINDAS, MAMÃES!

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

ALEITAMENTO MATERNO NÃO É “MODINHA”!


ALEITAMENTO MATERNO NÃO É “MODINHA”!
Cara Mariana Reade [1], aqui fala uma mãe que precisou dar complemento de leite artificial (LA) pro filho. Precisou fazê-lo porque, aos 16 anos de idade, cometeu a suprema burrice de se submeter a uma mamoplastia redutora nos seus seios. E depois, aos 33 anos de idade,  como consequência, não pôde amamentar o seu bebê. Se não existisse LA, meu filho teria morrido de fome, pois eu não tinha "pouco" leite, eu praticamente não tinha leite nenhum, devido à tal cirurgia, que mutilou minhas mamas para sempre.
Sim que bom q existe LA! Se ele não existisse, crianças como o meu filho, crianças cujas mães tivessem falecido; ou cujas mães não pudessem amamentar por motivos graves de saúde (mães soropositivas, por ex) ou até mesmo pequenos bebês adotados (é possível uma mãe adotiva amamentar através de relactação com sonda, mas nem todas conseguem)... bom, sem o LA, talvez esses bebês que citei morressem de fome.
Mas vale lembrar que esses casos são a exceção, não são de forma alguma a regra! A imensa maioria das mães (salvo, talvez, casos tão graves como os que citei) não apenas pode, como DEVE fazer aleitamento materno exclusivo até no mínimo os 6 meses de vida do seu rebento. Isso não é "achismo", nem muito menos "modinha". É recomendação cientificamente embasada, feita pela Organização Mundial de Saúde. Curiosamente, a OMS, ou nenhum outro órgão científico sério, aponta o aleitamento materno como “moda”. Mas a revista para a qual você escreve, assim intitulou o aleitamento materno... e na página ao lado, publicou um anúncio de LA! Mera “coincidência”, com certeza!
Se o LA existe, ele deve ser usado nos raros e poucos casos das crianças que realmente precisam muito dele, e não como complemento dado a todos os bebês apenas porque eles choram. O choro é a forma de comunicação natural do bebê. Na verdade, é a única forma de comunicação de que ele dispõe. Por tanto, bebês choram como forma de comunicar todas as necessidades que sentem: sono, fome, cansaço etc. E, sobretudo, de comunicar o desemparo [2] que sentem, visto que os bebês têm uma enorme necessidade de contato físico, mas a sociedade ocidental, em oposição ao que a evolução natural tem feito ao longo de milhares de anos, recentemente decidiu que isso não é uma necessidade, deu ao desamparo o nome de “manha”, e decretou que os bebês devem ser mantidos longe do colo de suas mães, lugar ao qual pertenceram por séculos, a fim de não ficarem “mimados”.
Uma mãe que interpreta todo e qualquer choro do bebê como sendo "fome", ou "cólica", está muito mal informada, devo dizer. E ela não precisa de conselhos estúpidos tais como dar "complemento" de LA apenas para fazer o bebê parar de chorar. Ela precisa de conselhos que a façam compreender a natureza do comportamento do bebê, que a estimulem a oferecer colo, carinho, amor, peito e LEITE MATERNO em livre demanda, atendendo aos pedidos do bebê. Se a mãe e o bebê encontrarem dificuldades reais na amamentação (e elas são inúmeras, desde rachaduras e fissuras no seio, pega incorreta do bebê, mastite e diversas outras possíveis) também não devem ser orientados a simplesmente dar complemento de LA. Praticamente todos os problemas e dificuldade iniciais no aleitamento materno podem ser resolvidos com medidas simples, que a mãe poderá aprender se procurar ajuda num Banco de Leite Humano. A rede de BLH do Brasil é uma das maiores (se não a maior) do mundo, e lá qualquer mãe, que esteja enfrentando qualquer tipo de dificuldade com a amamentação, poderá obter ajuda num serviço público, gratuito, especializado, e de altíssima qualidade. Mas isso a revista para a qual você escreve também não divulgou. Será, talvez, porque necessita dos anúncios pagos pelos fabricantes de LA?
                Enfim, Mariana Reade , se a sua coluna se propõe a dar voz ao bebê (o que aliás é uma proposta louvável, visto que infância, em sua raiz, significa “sem voz”), talvez você tenha se equivocado ao interpretar o choro, essa poderosa VOZ do bebê. Um recém-nascido que chora não está pedindo uma mamadeira de LA. Se ele pudesse falar com palavras, além de falar através do seu choro e de toda a sua expressão corporal, penso que talvez ele lhe dissesse o seguinte:
                “Por favor, acolha-me com amor! Eu fui feito para os seus braços, tome-me neles! Deixe que eu faça do seu colo o meu ninho. Deixe que a minha pele sinta a sua pele. Deixe que o meu olhar encontre o seu olhar. Deixe que as minhas mãos toquem a sua mão. Deixe que os meus lábios recebam o seu leite, como a mais profunda prova de amor, mamãe! Quando eu crescer, não vou me lembrar conscientemente desses momentos que passamos juntos, mas você, mamãe, se lembrará de cada um deles. Cada noite acordada, dando-me de mamar, será a sua mais preciosa lembrança. E, embora eu não tenha esta memória na minha consciência, esta prova de amor que você me deu, tão gratuitamente, ecoará para sempre na minha capacidade de amar a mim mesmo e ao próximo.”
[1] A jornalista citada escreveu uma coluna na revista “Pais e Filhos”, em que dizia que no Brasil há uma “modinha de amamentar”. A coluna foi publicada em novembro/2012 no endereço eletrônico http://revistapaisefilhos.uol.com.br/blogs-e-colunistas/bebe-blogando/ha-um-ano-atras-leite-em-po?fb_comment_id=fbc_730315286996102_7579107_730427123651585#f24e6ff204. Porém, assim que choveram textos de internautas criticando duramente (e com toda a razão) a coluna, a revista retirou-o de circulação e publicou uma “errata” (http://revistapaisefilhos.uol.com.br/na-midia/erramos).
[2] Não uso aqui a palavra “desamparo” por mero acaso. Desde a sua fundação, a psicanálise nos esclarece sobre o “desamparo inicial do lactente”.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

A SEMENTE DA VIOLÊNCIA


(por Dr. Antônio Marcio Junqueira Lisboa) [*]

A sociedade se interroga querendo saber o porquê da violência contra um pobre índio, queimado por um grupo de adolescentes de classe média alta. Infelizmente, tal como soubemos pelos jornais, queimar mendigos por brincadeira ou perversidade é uma ocorrência relativamente comum, em algumas capitais. Há poucos dias três rapazes foram entregues pela polícia aos populares, que, após tentarem linchá-los, acabaram queimando-os vivos. Em São Paulo, Rio, Porto Alegre pais são assassinados pelos filhos, sem nenhuma razão aparente ou atrás de herança. Adolescentes, sem habilitação, em carros importados, matam pessoas, sob a vista grossa dos pais, que se desculpam dizendo não conseguir controla-los.
Em todas as funções ou profissões, encontramos marginais: deputados que roubam, vendem-se ou defendem privilégios inaceitáveis; juízes venais; médicos cobrando “por fora”; sacerdotes abusando de crianças; advogados desonestos; policiais que ficam milionários à custa de achaques e mutretas; policiais mancomunados com delinquentes que ameaçam a população e matam por motivos fúteis; militares de altas patentes que enriquecem à custa de licitações fraudulentas; políticos que entram para o governo pobre e saem riquíssimos; pessoas de alta sociedade envolvidas com tráfico de drogas; cidadãos ditos respeitáveis comprando e vendendo meninas, estimulando a prostituição; funcionários usando seus cargos para enriquecer ilicitamente.
Entretanto, o pior de tudo é a violência encoberta, aquela que ocorre no lar, onde se contatam espancamentos, maus tratos, estupros, sem punição. A doméstica, que representa quase metade dos casos de violência sob suas diferentes apresentações, tem enorme importância em sua gênese e perpetuação.
Os fatos são registrados pela mídia de todos os países, pois a violência é universal. Infelizmente, está sendo combatida de forma errada. As ações advogadas, que chamamos de curativas, são dirigidas ao controle dos fatores predisponentes, ou mesmo dos desencadeantes, nunca contra os determinantes, mais importantes, e que deveriam ser realmente combatidos.
Há mais de dez anos, em todos os inúmeros fóruns de que tenho participado, tenho denunciado esse erro de direção, sem conseguir sensibilizar as autoridades que continuam a acreditar que, melhorando a situação socioeconômica, acabando com a miséria, o racismo, a impunidade, o narcotráfico, treinando policiais, construindo prisões e centros de recuperação, matando marginais, denunciando agressores, infratores, delinquentes, criando conselhos e delegacias especializadas, iremos conseguir controlar ou diminuir a violência. Ledo engano. São medidas paliativas. Afinal, tudo isso vem sendo tentado há quase um século. E os resultados? O clima de terror cresce assustadoramente. Assaltos, sequestros, homicídios, estupros, roubos fazem parte do dia a dia. Sobressaltada, trancada em casa – algumas são verdadeiras fortalezas – sem poder sair à noite, a população inerme não sabe mais o que fazer. Infelizmente, nem os órgãos de segurança, que confessam abertamente sua impotência em controlar a situação.
A semente da violência é plantada na criança antes dos seis anos. Franco Vaz já disse isso em 1914. Existe uma fórmula segura para se criar delinquentes, marginais, criminosos, corruptos. Basta atuar sobre a criança: não lhe dê atenção, ignore-a, humilhe-a e provoque-a; grite um bocado. Mostre sua desaprovação por tudo o que ela fizer; encoraje-a a brigar com os irmãos, os colegas e amigos; brigue bastante, principalmente no sentido físico, com seu parceiro conjugal, na frente das crianças; ameace, grite e bata bastante nela; engane-a, minta-lhe. Seja também permissivo. Ensine-lhe que o mundo é dos espertos, vangloriando-se junto a eles dos atos de que deveria se envergonhar.
E se isso não resolver, coloque-a em frente à televisão e dê-lhe carta branca para assistir a todos os espetáculos violentos possíveis. E também às novelas, em que a desestruturação familiar é mostrada como um ganho social, e as safadezas, as imoralidades e os atos de atentado ao pudor são mostrados como fatos moralmente aceitáveis. Essas medidas são infalíveis para plantar na criança, seja ela pobre, rica, branca, negra, amarela, brasileira, americana, inglesa, japonesa, a semente da violência.
Daí pra frente, bastará encontrar um terreno fértil para que ela cresça, germine e dê os seus frutos – a truculência, os furtos, os assaltos, os sequestros, as torturas, os estupros, a corrupção, a agiotagem.
Até os seis anos a criança não é violenta. Nosso grande trabalho será o de combater os fatores responsáveis pela implantação dessa semente. Sua existência, ou não, explica por que um motorista leva uma fechada e não se importa, e outro desce do carro, ameaça, briga e até mata. Ou por que um taxista encontra uma pasta com dinheiro, procura o dono e a devolve; e outro, mesmo sabendo quem é o dono, não a devolve e ainda faz uma festa em comemoração.
Toda ação deverá ser dirigida no sentido de proteger a criança dos fatores que possam da normalidade no início de estruturação de sua personalidade, do seu caráter, da sua moral. Ou seja, antes dos dois anos. Um dos mais importantes deles é a privação materna. Nenhuma criança deveria ficar um dia sequer além do necessário para se conseguir uma substituta, o que implicaria profundas mudanças no sistema de adoções.
Como esses exemplos, inúmeros outros conhecidos e infelizmente desconsiderados em sua importância pelos especialistas no combate à violência. A tarefa será árdua, mas, a meu ver, menos do que acabar com a impunidade e, além disso, muito mais barata. Por que, em vez de continuarmos tentando acabar, sem resultado, com os delinquentes, não passamos a trabalhar no sentido de formar bons cidadãos?

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[*] O presente texto foi extraído do livro “Seu filho no dia a dia: dicas de um pediatra experiente”, editora Record. O livro é uma coletânea dos textos que O Dr. Lisboa publicava na sua coluna no jornal no “Correio Brasiliense”, na década de 1990. O livro tem textos com dicas sobre todos os tipos de dúvidas mais comuns dos pais, ao educarem e cuidarem dos seus filhos: alimentação, desempenho escolar, comportamento infantil (desde sexualidade, até agressividade) e etc. Se tem alguma coisa na qual o Dr. Lisboa é radical, é ser radicalmente CONTRA bater em crianças! Eu tive a felicidade e a honra de ter sido paciente dele quando era criança. AMODORO!