Quando
estava grávida preparei o enxoval do meu filho, e também o quartinho do bebê,
“conforme manda o figurino”. Ou seja, um quarto tradicional, como todo mundo conhece:
cômoda, berço, guarda roupas, borda de papel de parede e nichos na parede com
enfeites. As amigas que já tinham filhos me diziam que eu não usaria nada
daquilo, mas eu não dava importância, atribuía à implicância com as mães de
primeira viagem. Não fui do tipo que gastou os tubos, mas fiz o tal quartinho
com “tudo o que o bebê tinha direito” (ou que eu achava que eu tinha direito).
Não vou dizer que o quarto do meu
filho foi de todo inútil (risos), mas o fato é que o bebê sempre passou muito
mais tempo no meu quarto, no bercinho móvel de camping instalado ao lado da
minha cama. Assim que ele começou a se locomover (primeiro engatinhando, depois
andando, como todas as crianças do mundo) já “usava” um pouco mais o seu
quarto, para brincar no chão. Foi então que ficou óbvio para mim o que eu não
havia percebido antes: a inutilidade de fazer para o bebê um quarto que é
moldado para o tamanho dos adultos. Por quê todos os brinquedos devem ficar em
nichos no alto, se quem vai brincar com ele não tem nem ao menos um metro de
altura? Por quê um espelho colocado num lugar que o bebê não alcança para ver a
si mesmo? Por quê quadros ou outros objetos de decoração colocados fora do
alcance da vista do bebê? Por quê um berço de onde ele não pode entrar e sair
sozinho? [1]
Então comecei a fazer modificações no
quarto dele, tornando-o cada vez mais acessível para o meu filho. Comecei
tirando a grade lateral do berço e rebaixando o estrado o máximo possível,
afinal havia comprado um berço que permitia essas modificações. Depois tirei os
brinquedos dos nichos na parede, e coloquei em estantes baixinhas no chão, pra
que ele pudesse brincar à vontade, sem depender de ninguém que colocasse os
brinquedos ao seu alcance. Nessa época meu filho tinha por volta de um ano e
meio de idade. Essas pequenas mudanças fizeram tanto sucesso com o meu filho,
lhe proporcionando muito mais independência nas brincadeiras, que aos 2 anos
ele já tinha um quarto novo, totalmente acessível, e àquela altura eu já havia
me desfeito de todos os móveis de bebê e comprado móveis novos para o quarto
dele.
Ou seja... eu devia ter ouvido o
conselho das amigas que já tinham filhos, de que tudo aquilo seria usado por
muito pouco tempo! Quem nunca mordeu a língua depois de ter filhos, que atire a
primeira pedra! (Mais risos.) É por motivos como esse que hoje aconselho às
amigas que estão gestantes: NÃO faça um quarto para o bebê. Pelo contrário,
faça adaptações no SEU quarto para acomodar o bebê junto a você com conforto
para todos. Invista num berço móvel (que aliás, também é utilíssimo em viagens)
ou num bercinho desses que você pode acoplar à sua cama, numa boa poltrona para
amamentar com conforto e aproveitar pra descansar (nesse quesito adoro cadeiras
de balanço). E de resto, um bebê não preciso de mais do que isto. [2]
Quando ele começar a engatinhar, aí
sim você pode começar a pensar em adaptações de locais na casa onde ele possa
se exercitar e explorar o mundo ao redor com conforto e segurança. E quando ele
já estiver andando, daí sim talvez valha a pena começar a pensar num quarto
para ele.
Quando enfim chegar esta hora, aí vão
algumas das minhas dicas para montar um quarto legal para o seu filho. Foram
coisas que fui pensando à medida que as fazia, com base nas necessidades que
observava no meu filho, e também um pouco baseada nos meus 14 anos de sala de
aula com educação infantil (algumas dessas coisas eu já fazia em sala de aula).
E, para minha surpresa, depois descobri grupos e comunidades de mães baseadas
no Método Montessori que adotavam princípios muito semelhantes. Não segui o
Método Montessori, ou método algum, para montar o quarto do meu filho ou na sua
educação. Mas li diversas publicações sobre o assunto, especialmente as do blog
Lar Montessori (http://larmontessori.com/),
que são uma grande fonte de informação, reflexão e inspiração para quem tem
filhos.
E agora vamos às dicas práticas!
1) Deixe tudo ao alcance dos olhos e das
mãos
Como eu disse antes, geralmente
colocamos as coisas no quarto das crianças em nichos e prateleiras que são
dispostos... na altura dos adultos! Certa vez vi uma revista de decoração que
dava a “linda” ideia de fazer uma prateleira para guardar os brinquedos das
crianças no RODA TETO do quarto, para “aproveitar espaço”. Fiquei imaginando se
a intenção dos brinquedos é apenas decorativa, ou se ele devem ser de fato
usados pelas crianças. O que seria mais importante, a decoração ou a
brincadeira?
Eu não tenho dúvida de que me preocupo
muito mais com a brincadeira! Compro brinquedos pro meu filho não pra que eles
sejam usados como decoração, e fiquem juntando poeira lá no alto, mas sim para
que ele brinque à vontade, pois “brincar
é o trabalho da criança. Através do brinquedo, as crianças crescem, aprendem e
SE CURAM.” (BRAZELTON & SPARROW, p. 145).
Ás vezes os adultos também colocam as
coisas no alto também pelo motivo de que os objetos podem se quebrar ou
estragar. Mas o quarto da criança não é uma loja de porcelanas, certo?
Portanto, se um objeto pode se quebrar ou desmontar com facilidade, a ponto de
oferecer risco para a criança... ele NÃO deveria estar por lá!
Em outros locais da casa, como
banheiro, cozinha, área de serviço, podem sim haver objetos perigosos, que os
adultos manipulam no dia a dia, mas potencialmente arriscados para uma criança
pequena, que devem ficar fora de seu alcance e, de preferência, trancados com
travas de segurança apropriadas.
Mas o quarto da criança deve ser seu
espaço privilegiado de brincar, que ela pode explorar livremente, e não deve
ter nada que lhe ofereça perigo. Se o objeto é perigoso pro seu filho, tire-o
lá, simples assim. Se for um brinquedo que ele ainda não tem idade pra usar, é
melhor guardá-lo e esperar que tenha idade apropriada pra enfim colocá-lo à
disposição.
Outro motivo pelo qual muitas vezes
brinquedos são guardados no alto, longe das crianças, é o temor que os adultos
têm da “bagunça”. Acham que a criança vai espalhar tudo por todos os cantos, e
nunca irá organizá-los. Isso pode ser bem verdade quando o ambiente NÃO é
apropriado para a criança. Por exemplo, se os brinquedos estão guardados no tal
“roda teto”, ou em prateleiras altas, a criança não irá mesmo guardá-los, já
que não alcança o local. Ou se o ambiente está entulhado, tão cheio de coisas e
desorganizado, que a criança não sabe onde deve colocar cada coisa de volta
depois de brincar. Nesse ponto, vale lembrar duas coisas:
1º) A criança não aprende sozinha a
guardar as coisas. Não adianta dizer ao seu filho “depois de brincar você
precisa guardar”, se você não estiver junto com ele pra mostrar onde e como
fazer isso. Por isso, brinque junto com o seu filho (melhor oportunidade de
formar um vínculo profundo e conhecê-lo muito bem que você pode ter) e depois
guarde as coisas junto com ele também. Guardar os brinquedos não precisa ser
uma coisa chata, pode ser até bem divertida se vocês fizerem isso junto. Assim
a criança aprende com seu exemplo, e vê essa atividade com prazer.
2º) As crianças não precisam de
dezenas de brinquedos à disposição todos os dias para brincarem. O que nunca é
usado pela criança na brincadeira não é brinquedo, é entulho. Portanto só
atrapalha como excesso de estímulo, e provoca desorganização. Observe bem se o
seu filho não tem brinquedos em excesso, o que é mais do que comum hoje em dia.
Se ele tem brinquedos que usa pouco, separe alguns deles, e faça rodízio,
alternando os brinquedos que ficam expostos no quarto. Isso dá a sensação de
que sempre tem “novidade” e estimula bastante a brincadeira. Se ele tem
brinquedos que NUNCA usa, é sinal de que talvez sejam muito mais úteis para
outra criança. Estimule seu filho a doar e compartilhar!
Aqui em casa, para deixar tudo ao
alcance do meu filho em seu quarto, optei por móveis baixinhos e empilháveis.
Especialmente por prateleiras plásticas, que são muito baratas, leves (sem
risco de cair por cima da criança e machucá-la) e fáceis de limpar. Você as
encontra em lojas de utilidade doméstica, decoração/reforma e até
supermercados. Outra grande vantagem é que elas são empilháveis, você pode
montar estantes com 2 até 6 prateleiras. Mas fica a dica: quanto mais à altura
das mãos e dos olhos da criança, melhor. Digo por experiência própria, por
haver testado de todas as formas. Com as estantes organizadas com apenas duas
prateleiras percebi que meu filho tinha muito mais autonomia para pegar/guardar
o que desejava, e com isso ela brincava e divertia MUITO mais!
Estantes plástica desmontáveis agrupam os brinquedos por categoria:
pistas e carrinhos da Hot Wheels e jogos de tabuleiro estão todos juntos, por exemplo.
2) Organize e categorize os objetos
Quando os brinquedos estão guardados
de modo desorganizado, é muito pouco provável que a criança brinque sem
produzir muita bagunça. Por exemplo, se estiverem todos enfiados numa caixa ou
cesto gigante, ela terá de espalhar todos os itens para encontrar o que deseja,
e em poucos segundos produzirá um mar de brinquedos espalhados pelo chão. (Levante
a mão se já viu esta cena! =D ). Do mesmo modo, ao guardar tudo enfiado numa
caixa gigante ela aprende que “guardar” objetos significa apenas enfiá-los num
lugar fora de suas vistas.
As crianças pequenas ainda estão
desenvolvendo suas habilidades de categorizar as coisas. Por isso fazem tantas
perguntas, elas querem entender como o mundo funciona. E uma das coisas que as
ajuda a fazerem isso é terem um ambiente organizado à sua volta. Então
organizar o quarto e as áreas de brincadeiras de um modo funcional e organizado
não é bom apenas pra pôr ordem em casa... mas também pra ajudar as crianças a
ordenarem todo o mundo à sua volta! Não é fantástico? Aqui vão dicas práticas
para fazer isso:
a) Separe
os brinquedos por tipos e categorias.
Deixe os apetrechos necessários para cada brincadeira juntos. Por exemplo,
deixe as panelinhas e as comidinhas de plástico juntas; ou os carrinhos perto
das pistas de HotWheels.
b) Identifique
os locais apropriados para guardar cada coisa. Assim a criança sabe tanto aonde
pegar um item que ela deseja usar, quanto em que lugar deve guardá-lo depois de
brincar. Hoje em dia existem diversos potes plásticos já decorados com tema
infantis, que você encontra em lojas de utilidade doméstica, decoração/reforma
e até supermercados. Você pode usar cada pote para guardar as coisas de acordo
com a estampa: no pote do Homem Aranha coloque bonecos de super heróis, no pote
do Relâmpago McQueen coloque carrinhos, no pote em forma de legumes panelinhas
e comidinhas. Outra opção é usar potes transparentes e identificar cada um
deles com uma etiqueta, com o nome e a figura do que deve ficar guardado ali.
Pesquisando um pouco no “Googole imagens” você encontra fotos de todos os tipos
de brinquedos que você precisar.
c) Use
gaveteiros plásticos para separar miudezas. Eles têm diversas vantagens: são muito mais baratos do
que móveis de madeira, leves, fáceis de limpar e empilháveis, possibilitando
montagem do tamanho que você quiser. Novamente, que você os encontra em lojas
de utilidade doméstica, decoração/reforma e até supermercados. Existem até
mesmo modelos coloridos ou com estampas infantis. Aqui eu optei mesmo por
reaproveitar gaveteiros que já tinha, de cores neutras, Foram parar na
brinquedoteca do meu filho, organizando os infinitos bonequinhos e carrinhos
dele, e no cantinho da leitura, organizando a gibiteca. Coloquei etiquetas
ilustradas para identificar o que está guardado em cada gavetinha. Sucesso
total, e fim do gibis amassados ou bonecos e carros espalhados pelo chão!
Gaveteiros de plástico organizam e categorizam miudezas.
Potes plásticos decorados organizam os brinquedos: panelinhas e comidinhas estão nos potes em forma de frutas e legumes; bonecos de super heróis na caixa do Homem Aranha; carrinhos do balde do filme Carros e miniaturas do Toy Storu na caixa do filme.
Gaveteiro plástico organizando os gibis no Cantinho da Leitura.
3) Crie cantinhos apropriados para cada
atividade
Isso faz parte não apenas de organizar
e categorizar, mas cria ambientes propícios para cada tipo de brincadeira,
estimulando (muito!) a imaginação e o brincar. Por exemplo:
·
Cantinho do jogo: Para brincar com jogos de montar ou
de tabuleiro, é interessante ter uma mesinha infantil por perto. A criança já
brinca por ali e guarda logo em seguida. Há mesinhas plástica muito leves e
fáceis de limpar cujo preço é muito em conta, e que você encontra facilmente me
lojas e supermercados. Uma mesa assim pode ter múltiplos usos (brincar, fazer o
dever de casa, lanchar), portanto é um item muito interessante para adquirir.
Mesinha infantil próxima à ludoteca, para facilitar as brincadeiras com jogos de tabuleiro e brinquedos de montar.
·
Cantinho do faz de conta: Disponha bonecas, panelinhas, móveis
de miniatura para a criança brincar de casinha. (E SIM os meninos também podem
e devem brincar de casinha, se quiserem.) Também vale disponibilizar fantasia e
acessórios para a criança se fantasiar de herói, princesa, etc.
Brinquedos que estimulam o faz de conta.
·
Cantinho de artes: Pode ser uma mesa com cadeira e
apetrechos de desenho, massinha, recorte e colagem. Você pode também usar a
mesma mesa dos jogos, basta colocar os materiais de artes numa prateleira por
perto. As crianças também se divertem com quadro negro/branco/magnético para
brincar. Outra opção é separar uma parede (toda ela ou somente uma parte) para
as crianças brincarem, dentro ou fora de casa. Hoje em dia existem tintas
magnéticas, que podem deixar uma parede imantada. Ou se você pintar uma parede
com tinta fosca lavável na cor preta, ela vira um quadro de giz. Outra ideia e
colocar uma parede com azulejos brancos lisos, onde as crianças podem fazer
arte à vontade, e depois lavar (ou permitir que façam isso na parede do box do
banheiro, é diversão garantida).
Escrivaninha com materiais diversos para o desenho organizados em pequenos gaveteiros de plástico.
·
Cantinho da Leitura: Estante com livros e gibis ao alcance
da criança. Coloque um pufe, tapete ou cadeira confortável por perto, pra
criança ler e relaxar. Ele também pode simplesmente ser perto da cama, assim
ela pode se deitar e ler lá mesmo.
Cantinho da Leitura, com pufe no cantinho à direita, pra sentar/deitar e desfrutar dos livrinhos e gibis.
Ufa! Você deve ter ficado com a
impressão de que precisa morar numa mansão ou ter um quarto gigante para o seu
filho, além de um bocado de dinheiro, para fazer isso tudo, não é? Claro que
não! Em primeiro lugar, você não precisa fazer tudo de uma só vez, nem em um só
lugar. Vá construindo e oferecendo essas atividades aos poucos, de acordo com
os interesses que você observa no comportamento e desenvolvimento do seu filho.
Em segundo lugar, grande parte das coisas podem ser reaproveitadas, recicladas
ou compradas de segunda mão. E além do que, lembre-se: a criança não precisa de
toneladas de brinquedos, e sim de BONS brinquedos!
Vale lembrar também que esses
cantinhos não precisam ficar necessariamente todos no quarto da criança. É uma
grande idéia espalhá-los pela casa. Você pode ter uma estante com jogos num
cantinho da sala, e jogar com a criança na mesinha de centro. Pode colocar um
fogão de brinquedo e panelinhas num cantinho da cozinha, pra que a criança
brinque de fazer comidinha, enquanto você cozinha de verdade. Ou colocar uma
mesinha de plástico e os apetrechos de artes na varanda, onde a “sujeira”
dessas atividades seja até mesmo mais liberada. Dessa forma, você torna não
apenas o quarto da criança acessível e divertido pra ela, e sim toda a sua
casa, onde seu filho poderá desfrutar de momentos de prazerosa convivência com
toda a família.
NOTAS:
[1]
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[2]
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BIBLIOGRAFIA
BRAZELTON
T Berry; SAPARROW Joshua D. 3 a 6 anos: momentos decisivos do desenvolvimento
infantil. Porto Alegre: Artmed.