(por Dr. Antônio Marcio Junqueira Lisboa) [*]
As palmadas, as surras, as ameaças,
ensinam? Como não? Mas não o que os adultos esperam. Segundo a psicóloga Lídia
Aratangy, ao apanhar dos pais a criança aprende: a ser agressiva – pode achar
que bater nos outros é uma forma válida de resolver seus problemas; a ser
cínica – com o repetir das surras, desenvolve a capacidade de apanhar sem
reagir ou sem se sentir humilhada; a ser mentirosa – mente para fugir do
confronto e evitar a dor; ser covarde – pois fugir da dor pode se tornar um dos
objetivos mais importantes da sua vida.
O castigo físico provoca na criança
reações as mais diversas. A mais comum, semelhante à dos adultos, é um
sentimento de ódio contra o agressor. As surras repetidas e o sentimento de
impotência marcam profundamente as crianças, que esperarão a época oportuna
para se vingar, utilizando, para isso, o aprendizado recebido.
Sabemos que 48% das violências
praticadas contra as crianças são de origem doméstica, ou seja, ocorrem dentro
de casa, lugar onde esperariam receber carinho e proteção. Convivendo com a
brutalidade, elas aprendem a agredir qualquer tipo de autoridade. Como já lhes
disse, a criança com menos de seis anos não esquece e poderá reproduzir futuramente
o aprendido, tornando-se mais uma a engrossar a onda de violência e
criminalidade. Pais agressores criam filhos agressores, perpetuando o ciclo da
violência.
Ao invés de tornar a criança
agressiva, os castigos físicos também podem torna-la o oposto – submissa,
tímida, amedrontada, sem iniciativa – vendo nos outros os pais que poderão
castiga-la a qualquer momento e aceitando sem discussão as imposições de outras
pessoas. Infelizmente, essas características, tal como as do comportamento
violento, podem se perpetuar na vida adulta.
A agressividade tem o seu aspecto
positivo. É uma forma de energia que permite ao indivíduo lutar por seus
ideais, combater as injustiças, progredir na vida. Enfim, crescer como cidadão.
Não podemos permitir que essa energia seja destruída ou canalizada para a
violência.
Quando as punições são excessivas, as
consequências dependerão da carga genética da criança, sendo impossível a
previsão de seu comportamento na idade adulta. Cada criança tem sua própria
individualidade. Quando nasce, já traz consigo a capacidade de amar, odiar,
agredir, respeitar. A disposição para o amor ou para o ódio é extremamente
influenciada pelo meio em que vive, principalmente o familiar.
Um outro ponto importante que poderá
parecer divergente doo que apresentamos, mas não o é, está relacionado com as
ameaças de castigo. Se um pai diz ao filho para não fazer algo ou levará uma
palmada ou outro tipo de punição deverá sempre cumprir o prometido. Caso
contrário, haverá um grande desgaste de sua autoridade. Repetidas as ameaças e
não cumpridas, a criança passará a não acreditar que possa ser punida por
qualquer tipo de comportamento errado. Essa situação é extremamente comum e
prejudicial para o aprendizado pela criança das normas e regras que irão
regular sua condita, ou seja, a disciplina. Por esse e outros motivos é que
devemos retirar as palmadas, tapas ou surras, pois seria penoso cumprirmos o
prometido.
A disciplina precisa e deve ser
ensinada por meio do diálogo, do bom senso, da justiça, da sabedoria e do
equilíbrio, sem necessidade de se apelar para os castigos físicos. Pais amigos
são os melhores disciplinadores.
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[*] O presente texto foi extraído do livro “Seu filho no
dia a dia: dicas de um pediatra experiente”, editora Record. O livro é uma
coletânea dos textos que O Dr. Lisboa publicava na sua coluna no jornal no
“Correio Brasiliense”, na década de 1990. O livro tem
textos com dicas sobre todos os tipos de dúvidas mais comuns dos pais, ao
educarem e cuidarem dos seus filhos: alimentação, desempenho escolar,
comportamento infantil (desde sexualidade, até agressividade) e etc. Se tem
alguma coisa na qual o Dr. Lisboa é radical, é ser radicalmente CONTRA bater em
crianças!
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